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26 de novembro de 2010

Isabel fez a primeira abolição e Dilma pode realizar a segunda

O fim da miséria é a primeira prioridade de seu governo

É fato notável a ascensão de mulheres, em muitos países, ao status de chefes de Estado e de governo. Isso revela uma mutação do estado de consciência que se está operando na humanidade. Foi mérito principal da reflexão feminista inaugurar essa transformação. As mulheres começaram a se ver com os próprios olhos e não mais com os olhos dos homens. Produziram talvez a crítica mais consistente e radical da cultura, marcada pelo patriarcalismo e pelo androcentrismo.

O patriarcado designa uma forma de organização social centrada no poder exercido pelos homens, subordinando e hierarquizando todos os demais. O androcentrismo se caracteriza por estabelecer como padrão as formas de pensamento e de ação características dos homens.
O patriarcado e o androcentrismo subjazem às principais instituições das sociedades com as tensões e os conflitos que provocam. A eles se deve o surgimento do Estado, das leis, da burocracia, da divisão de trabalho, da ciência e tecnologia imperantes, dos exércitos e da guerra. As feministas viram, além da dominação cultural, também a dominação social das mulheres, feitas pobres e oprimidas pelos donos do poder.

As mulheres nos ajudaram a ver que a realidade humana não é feita apenas de razão, eficiência, competição, materialidade, concentração de poder e exterioridade. Nela há afeto, gratuidade, cuidado, cooperação, interioridade, poder como serviço e espiritualidade. Tais valores são comuns a todos os humanos, mas as mulheres são as que mais claramente os vivem. O ser mulher é uma forma de estar no mundo, de sentir diferentemente o amor, de relacionar corpo e mente, de captar totalidades, de pensar não só com a cabeça, mas com todo o ser e de ver as partes como pertencentes a um todo.

Hoje, devido à crise que assola a Terra e a biosfera, pondo em risco o futuro do destino humano, esses valores se mostram urgentes, pois neles está a chave principal da superação.
É nesse contexto que vejo as mulheres à frente dos governos, no caso de Dilma Rousseff como presidente.

Na nossa história, tivemos uma mulher, considerada a Redentora: a princesa Isabel (1846-1921). Substituindo o pai, dom Pedro II, em viagem à Europa, num gesto bem feminino proclamou, em 28 de setembro de 1871, a Lei do Ventre Livre. Os filhos e filhas de escravos já não seriam mais escravos. Financiava com seu dinheiro sua alforria, protegia fugitivos e montava esquemas de fuga para eles. Numa outra ausência do pai, a 13 de maio de 1888, fez aprovar pelo Parlamento a Lei Áurea, da abolição da escravatura. A um de seus críticos, que lhe gritou: "Vossa Alteza liberou uma raça, mas perdeu o trono", retrucou: "Mil tronos eu tivesse, mil tronos eu daria para libertar os escravos do Brasil". Queria indenizar os ex-escravos com recursos do Banco Mauá. Preconizava a reforma agrária e o sufrágio político das mulheres. Foi a primeira abolição.

Cabe agora à presidente Dilma realizar a segunda, propugnada há anos pelo senador Cristovam Buarque num famoso livro com esse mesmo título: a abolição da pobreza e da miséria. Ela colocou como primeira prioridade de seu governo "o fim da miséria". Esta é concretamente possível. Por enquanto, é apenas uma promessa. Se realizar essa façanha, verdadeiramente messiânica, poderá ser a segunda Redentora.

Aos cidadãos urge apoiar e cobrar a promessa e impedir que se transforme numa má utopia. Podemos ser condenados pelos poderosos, mas não podemos defraudar os pobres e os oprimidos.

escrito por :Leonardo Boff

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